quarta-feira, 7 de março de 2012

A vida de Francisco de Assis


Entrevista com Paulo Fernando sobre a vida de Francisco de Assis, você também pode conferir essa entrevista na Revista Alma Animal Online nº 1, basta clicar aqui.





Paulo Fernando tem 42 anos de idade. Casado e pai de três filhos do coração. Atualmente é servidor estadual. Sua formação acadêmica é História, sendo que lecionou a referida matéria e também Filosofia na rede estadual de ensino do Estado de São Paulo. Quando jovem, morou num convento da Ordem dos Frades Menores Capuchinhos, em Botucatu – SP, e depois como seminarista na Ordem dos Frades Menores Missionários, em Guarapuava, PR. “Foi uma experiência enriquecedora da qual, tenho a oportunidade de compartilhar um pouco do conhecimento dessa figura notável da História”, escreve Paulo.

“Para mim, Francisco conseguiu entender a verdadeira mensagem de Jesus Cristo contida no Evangelho.”

Alma Animal: Dante Alighieri, considerado o primeiro e maior poeta da língua italiana, considerava Francisco de Assis uma "luz que brilhou sobre o mundo", e para muitos ele foi a maior figura do Cristianismo desde Cristo. Qual a sua opinião sobre esta afirmação?

Paulo: Para mim, Francisco conseguiu entender a verdadeira mensagem de Jesus Cristo contida no Evangelho. Conseguiu ir além da letra e do texto simples e decidiu por em prática aquilo que Jesus Cristo nos ensinou, ou seja, amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo. Vivenciou o verdadeiro amor em suas relações nessa nossa condição de vida neste mundo, isto é, nossa relação com Deus, depois consigo mesmo, com o próximo, com a natureza e com todo o universo. Ademais, provou que o Evangelho não é uma loucura, ou algo impossível para os homens, mas algo real e factivel para aqueles com boa vontade, disposição e coragem para viver a proposta de Jesus. Nisso é que, para mim, Francisco se torna único e especial. Lendo as biografias e os escritos de Francisco, podemos até parafrasear outra figura notável, Albert Einstein, que, se rerefindo a Gandhi, outro que merece admiração, por ocasião de seu falecimento, declarou: “As gerações que vierem não acreditaram que uma pessoa como essa caminhou sobre a Terra em carne e osso”. O mesmo se aplica a Francisco.

Alma Animal: Muitas histórias com animais cercam a vida de Francisco de Assis. Elas estão contadas no Fioretti (pequenas flores, em italiano), uma coleção póstuma de contos populares sobre este santo. Há relatos da veracidade das histórias? Qual a sua opinião?

 Paulo: Há sim. E os relatos são tantos que chegamos até duvidar se são verdadeiros. Mas são. Não existe apenas o Fioretti, mas também diversos outros textos escritos por contemporaneos, companheiros de ordem, testemunhas as mais diversas que atestam tal relação de Francisco com os animais. Penso que tal pessoa era tão amante de Deus e de toda a sua obra que tal amor emanava de sua pessoa e era percebida por todos os que dele se aproximavam, incluindo os animais, pois é sabido que os mesmos são capazes de notar ou de perceber nossas emoções ou estados de humor, quanto mais uma vibração tão forte como é a que vinha de um amor sincero e profundo como a de Francisco de Assis.

“(...) o ato de comer carne significaria a morte e o sofrimento de uma criatura de Deus, e isso contrariaria o sentimento de fraternidade universal que ele possuía.”

Alma Animal: Pode-se dizer que o presépio é uma invenção de Francisco de Assis que nos remete a recriar o nascimento de Cristo e o respeito para com os outros animais?

Paulo: Sim. A vontade de Francisco de representar o nascimento de Jesus, com toda a singela que é descrita no Evangelho, juntamente com o seu amor ao Mesmo, o fez criar o presépio em 1223, na região de Greccio, Itália. Sua intenção, certamente, era que toda criatura, homem, animais e também o mundo mineral, contemplassem o nascimento do Divino Mestre. Atualmente, vemos presépios onde há uma diversidade enorme de animais que nos leva a refletir que estes merecem nosso respeito e nosso carinho porque são, como Francisco afirmava, nossos irmãos.

Alma Animal: Há relatos que Francisco de Assis falava com os outros animais, parecendo que estes entendiam e, aproximando-se dele espontaneamente, mesmo quando selvagens, davam sinais de compreenderem suas palavras ao obedecerem suas instruções. Qual a sua visão e possível explicação para o fenômeno?

Paulo: Quem tem um animal de estimação, e o trata bem lhe dando carinho, respeito e o cuidado necessários, sabe que muitas vezes seu animal parece que entende certas coisas de seu “dono”. Na verdade, os animais, principalmente os de estimação, sentem nossas emoções, sabem quando estamos alegres, tristes, preocupados, impacientes ou irritados. Tal fato é objeto de estudo de profissionais da área. No caso de Francisco, com uma energia amorosa que vibrava intensamente, os animais percebiam e recebiam tal vibração podendo até “entender”, dentro daquilo que lhe permitido à sua condição natural de evolução, seja por espécie ou individual, o que ele, Francisco, desejava. Há relatos de que ele pregava aos animais as maravilhas de Deus e os mesmos pareciam entender. Penso que durante tais ocasiões, sua energia, tão vigorosa, era de tal maneira transmitida e recebida pelos animais em uma frequência ou sintonia que os faziam assimilar certas ideias ou sentimentos de Francisco de acordo com o que seu aparato cognitivo era capaz de assimilar. É bom lembrar que os animais têm o mesmo princípio inteligente que em nós se manifesta, mas em estado latente e em evolução.

“(...) tal amor emanava de sua pessoa e era percebida por todos os que dele se aproximavam, incluindo os animais (...)”

Alma Animal: Alguns grupos cristãos não acreditam na existência da alma dos animais em sua individualidade. Acreditam que a alma dos animais seja muito inferior à alma do homem, atribuindo-lhes apenas a forma material, quando morrem esta forma se perde. Por outro lado, certa vez o Papa João Paulo II proclamou “Os animais possuem uma alma e que os homens devem amar”, “(...) todos os animais são fruto da ação criativa do Espírito Santo e merecem respeito” e “estão tão próximos de Deus como estão os homens.”

a) Qual a sua opinião sobre isto?
b) Com a evolução da Ciência, você acredita que os grupos religiosos mais tradicionais aceitam a Teoria da Evolução das Espécies (Darwin)?
c) Francisco de Assis, em algum momento de sua vida, relatou sobre a alma do homem e/ou dos animais?

Paulo:
a) Minha opinião a respeito vai de encontro com a do Papa João Paulo II. Tal declaração aponta um avanço no entendimento sobre a questão da espiritualidade dos animais. Francisco de Assis, muito a frente no tempo, inclusive ao de hoje, não tinha dúvidas quanto a isso quando chamava irmãos e irmãs todas as criaturas, mesmo as menores “... pois sabia que elas e ele procediam do mesmo e único princípio”. (São Boaventura, Legenda Maior – Cap. 8, nº 6).

b) Acredito que é possível sim haver um entendimento melhor quanto à evolução como um todo no que concerne a existência do universo e de tudo o que nele se encerra. O problema reside na cristalização de ideias devido a medo, a orgulho, a inveja, ou outro sentimento inferior que ainda possuímos. Hoje é possível discutir abertamente tais conceitos e ideias, mesmo sob protesto de um ou outro grupo, antigamente não era possível. Na época de Francisco, o simples argumento de que o homem não era a criatura maior de Deus e de que tudo neste mundo estava submetido a sua vontade, seria considerado perigoso podendo até ser passível de punição. Nesse contexto, Francisco correu um risco e tanto ao expor suas ideias.

c) Francisco teve sob seus cuidados, durante um tempo, um cordeirinho que depois o entregou a sua amiga Jacoba de Settesoli de Roma. Segundo relatos, Francisco instruiu o animal nas coisas espirituais que o mesmo passou a demonstrar um comportamento de reverência em ocasiões de oração ou em missas. Poderia ser um condicionamento? Podia. Mas penso que Francisco não tinha nem jeito e nem tempo para tal coisa. Outro exemplo é o lobo de Gubio, onde Francisco conversou e pacificou o animal em sua passagem pela cidade. Ele instruía, falava e se comunicava com todas as criaturas sobre as coisas espirituais e isso concorre para deduzir que para ele os animais possuem uma alma. Podia não declarar isso, porque poderia ser muito mal compreendido naquela época, mas seu comportamento e atitudes indicam isso sim. Como Francisco poderia instruir o animal nas coisas espirituais se o mesmo não tivesse uma espiritualidade, ou seja, uma alma? Pelo menos é o que eu penso.

“Como Francisco poderia instruir o animal nas coisas espirituais se o mesmo não tivesse uma espiritualidade, ou seja, uma alma? Pelo menos é o que eu penso.”

Alma Animal: Considerando os outros animais como seus irmãos, tem-se relatos que Francisco de Assis era vegetariano (não comia carne)? Como a ordem Franciscana encara o assunto?

Paulo: Baseando nos escritos e relatos do primeiro século pós a passagem de Francisco, não há nenhuma afirmação cabal de que ele não comia carne. Entretanto, pode-se afirmar que ao longo de sua vida, seu amor e compreensão das coisas de Deus, manifestadas na natureza como um todo, foram crescendo, se intensificando e se aprofundando de tal maneira que o ato de comer carne significaria a morte e o sofrimento de uma criatura de Deus, e isso contrariaria o sentimento de fraternidade universal que ele possuía. São Boaventura, biógrafo de Francisco, relata: “Ás vezes resgatava cordeiros levados ao matadouro, em lembrança do Cordeiro (Jesus Cristo)...” (Legenda Maior, cap. 08 – nº 06); Outro biógrafo, Tomás de Celano, relata: “... perto do porto do lago de Rieti, um pescador pegou um peixe muito grande, (...), e lhe deu de presente com devoção. Francisco recebeu com alegria e bondade, começou a chamá-lo de irmão e, colocando na água fora da barca, começou a abençoar devotamente o nome do Senhor. Enquanto rezava o peixe ficou brincando na água” (Tomás de Celano, Vida I – cap. 22, nº 66).

Devemos lembrar que Francisco foi um homem medieval e naquela época, século XIII, na Europa, o comer carne era algo muito diferente aos dias atuais. Primeiro não havia essa indústria e comercialização de carne como há atualmente com rebanhos sendo criados para esse fim único. Animais como bois eram considerados importantes naquela época porque eram usados para a tração de carga e para aragem, uma vez que cavalos eram montarias dos nobres e ricos. A carne era, podemos dizer um artigo de luxo. E não a carne bovina, mas a de porco e frango, pois estes eram de fácil criação não necessitando de grande dispêndio para tanto. Segundo, a maior parte da população, que era de pobres, tinha sua alimentação baseada em legumes, vegetais e trigo. O pão era o alimento básico na época. Assim podemos concluir associado ao sentimento de amor às criaturas de Francisco, que o mesmo, uma vez se tornando pobre por amor a Deus, ele se alimentava como os mesmos daquela época. Agora, entendo que as Ordens Franciscanas deixem tal questão a foro íntimo, não impondo aos seus um ato que para muitos pode ser considerado um rigorismo. Contudo, há dentro das Ordens, aqueles que já aceitam o jeito de ser de Francisco em relação a tal assunto. Francisco não impunha aos seus irmãos aquilo que eles não podiam fazer; queria, principalmente pelo exemplo e caridade, que os mesmos percebessem e assimilassem certas verdades que ele já entendia desde aquela época e que nós, agora, estamos começando a nos conscientizar.

“É bom lembrar que os animais têm o mesmo princípio inteligente que em nós se manifesta, mas em estado latente e em evolução.”

Gostaríamos de agradecer imensamente ao Paulo por sua disponibilidade e por compartilhar tão rico conhecimento que nos enche a alma de luz. Muito obrigada!

Um comentário:

  1. Simplemente maravilhoso esse esclarecimento....Muito Obrigada

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